01/03/2008

As Várias faces de Jackie S. - Face 8 - A Colombina

Jackie vestiu os olhos de alegria e espalha pelo salão o cheiro de quem tem as asas tremidas pelo vento. “Engole, Jackie, engole o medo, que por quatro dias o mar é inteirinho seu, e o sal se fará leve e a dor só vai chegar quando desabar o cinza em sua cor”. Jackie enxuga a lágrima de um certo Pierrot, e ambos rodam pela noite flertando com o amor. “Samba, samba, coração! Explode dentro do peito, e deixa que a vida cuida das feridas e do sangue que escorre pelas frestas da tristeza”. Eis que surge o Arlequim, fantasiado de arco-íris. Pierrot vê que no olhar de Jackie o amarelo se assanhou, mas, pobre palhaço distraído, não entende que Jackie nasceu dividida em mil pedaços e que é ele, o amarelo, que desalinha o seu andar. Arlequim, o audaz, dispara flechas em forma de sorriso, que cortam o ar e arranham todos os sentidos de Jackie, que sente o mar se remexendo entre suas pernas como o mar costuma se remexer quando o horizonte desce para ser lambido pelas ondas. “Traz o céu, Pierrot, traz de novo o céu do seu olhar que o chão está se abrindo e o mundo está caindo e o desejo me coça a língua”. E fez-se assim o triângulo que usa máscaras para esconder a lealdade, e divide o sonho para não ter que descolorir o mundo como pede a realidade. Mas Jackie deixou tudo se acabar na quarta-feira, calçou de novo as velhas pantufas cor de rosa e despiu dos olhos a alegria, já rôta da folia. Arlequim, dizem, todas as noites dorme abraçado à lágrima que roubou de Pierrot. E o Pierrot, apaixonado, que vivia só cantando, por causa de uma Colombina acabou descobrindo que amor é amor, que dor é dor, que cor é cor, e a cada 365 dias arranca quatro do calendário e transforma saudade em confete e serpentina.

Um comentário:

Arianne Pirajá. disse...

:)
deu pra sentir um cheirinho de alecrim.
“Traz o céu, Pierrot, traz de novo o céu do seu olhar que o chão está se abrindo e o mundo está caindo e o desejo me coça a língua”.
bom de ler.