19/06/2009

Sobre a desobrigatoriedade do diploma - Parte II

Não tenho a ilusão de que nossos doutos ministros do Supremo tenham votado a favor da não-obrigatoriedade movidos por percepção da necessidade de evolução. Mas, sem perceber, levantaram a lebre. Ou percebendo, não sei. Não é o jornalismo que está em crise. É a Comunicação. Ou melhor, essa instituição ao mesmo tempo vanguardista e caduca que chamamos de Comunicação. Os jornais. As agências de publicidade. Os tais. A comunicação mesmo, o ato de se comunicar, de espalhar notícias e fatos e acontecimentos não está em crise. Nunca foi tão livre, tão aberta, tão acessível, tão simples, tão fácil, tão democrática. O que está em crise é o sistema. Aliás, vamos mais longe: o capitalismo está em crise, e os jornalões e as redações e agencias de publicidade nos moldes do início do Século XX e as televisões e as rádios estão meio sem saber o que fazer. Essa é a discussão. Não a discussão do diploma ou do não-diploma. A obrigatoriedade do diploma era uma balela. Nos grandes jornais e emissoras e coisa e tal sempre se burlou a obrigatoriedade. Nos pequenos centros sempre se deu um jeito. Os apaniguados, os protegidos, os lambe-botas estão lá, nas redações, desde que o mundo conheceu seu primeiro jornal. Com diploma ou não, eles estão lá. A cultura do diploma é uma estratégia para legitimar os não-capazes. Porque os bons, bons de verdade, estarão lá dentro, com diploma ou sem, quando os donos quiserem. Também sempre estiveram e vão continuar lá. Outra armadilha é o “piso”. O malfadado. Alguém me disse que os patrões agora vão se esbaldar. Ora. O piso é uma armadilha. Sociedade do Espetáculo. Debord explica. Quem sou eu, mas vou tentar traduzir. O piso é o seguinte: os dominantes dão satisfações à sociedade dizendo que estão protegendo os profissionais, garantindo seus direitos, salvaguardando a dignidade, e blá. E, por trás, estão felizes. Porque o nome já diz, né? Piso. Nivela por baixo. “Hahahaha”, dizem os barões. Aí os profissionais, diplomados, “faculdados”, brigam por um piso. E todos ali, ao rés do chão. Ao invés de brigar pelo céu, choram pelo piso. Então. É o sistema que está em crise. A crise é do Capital. A crise é do Poder. E convenhamos que não há nada que dê mais suporte ao Capital e ao Poder que a comunicação. Jornais. Publicidade. A Internet chegou e balançou as bases. O celular. O Iphone. Os blogs. O MSN. Um twitteiro pode ter 50 mil seguidores. Sozinho. Custo zero. E pode não ganhar nada para ter os 50 mil followers. E uma twittada sobre algo chega a 50 mil pessoas instantaneamente. E se for algo bom, relevante, legal, chega a milhões. Que jornais no Brasil tem tiragens de 50 mil exemplares, e a que custo? É isso que deve ser discutido. O que é a Comunicação, hoje? Melhor: o que será a comunicação amanhã? O que será “o” jornal, o que serão os jornalistas? É isso. Isso é o principal. Porque o mundo está caindo. O mundo conhecido das redações e salas de criação não faz mais sentido. É hora de mirar na lua, e não de olhar para o “piso”. O diploma nunca foi tão importante, e tão diferencial. Quem já tem, que se sinta feliz por ter passado quatro anos aprendendo todas as teorias. Mas que faça, do diploma, não um bilhete para emprego. Mas um símbolo inquestionável de que se aprendeu mais sobre algo do que outros. De que se é bom no que faz. A Comunicação agradece.

6 comentários:

Sam disse...

A Ivana Bentes, professora de jornalismo da UFRJ escreveu assim: "O fim do diploma tira da "invisibilidade" a nova força do capitalismo cognitivo, as centenas e milhares de jovens free-lancers, autônomos, midialivristas, inclusive formados em outras habilitações de Comunicação, que eram impedidos por lei de fazer jornalismo e exercer a profissão e que, ao lado de qualquer jovem formado em Comunicação, constituem hoje os novos produtores simbólicos"

Breno Brito disse...

Muito bom André. Essa é uma realidade que observamos provavelmente na maioria dos alunos, que estão nas faculdades apenas para receber um diploma.

F3rnando disse...

Ainda acho que isso vai ser um tiro no pé. A curto prazo, claro.

Mariana Arraes disse...

Diploma não é passe pra nada. Nunca foi. A grande maioria de jornalistas diplomados que lamentam o ocorrido não estão preocupados com isso.

O problema maior é que mexeram com um negocinho importantíssimo chamado EDUCAÇÃO e CULTURA.

Em outras palavras: encontraram mais um jeito de burlar a pobre coitada da EDUCAÇÃO.

É que todo mundo sabe que sem diploma vai ser bem melhor. Afinal, o brasileiro sempre vai pelo caminho mais fácil.

Mariana Arraes disse...

não estão = não está

[sabe como é.. tenho problema com digitação errada. ho ho!]

Ricardo Dias disse...

Vocês esquecem que o período áureo de nossa imprensa, os grandes, foram todos da época sem diploma. O que precisa acabar é a indústria das faculdades inúteis: economia doméstica, excrescências desse tipo. Um bom curso técnico substituiria com vantagem 70% dos nossos cursos universitários.