11/10/2006

É cor de rosa choque

Certo, Clodovil é meio antipático. Certo, Clodovil é afetado, bichona e um tanto quanto “louca”. Tudo bem, ele não tem planos nem projetos, nem é alguém “politizado enquanto cidadão”. Clodovil é um encrenqueiro, língua solta, e, ao que tudo indica e todos que não votaram nele dizem, entrou nessa por falta do que fazer. Pode-se dizer que Clodovil é uma piada, uma gozação do brasileiro, e que é um absurdo a legislação eleitoral permitir que “gente como ele” chegue à “Casa da Democracia”.
Mas, sinceramente falando e você pensando aí com seus botões, não vai ser divertido ter um Clodovil na Câmara? Tudo depende do olhar com que se vê a eleição de Clodovil Hernandez, um dos candidatos a deputado federal mais votados do país.
Aos que se referem a ele como a “bicha” que está de brincadeira com o eleitor, podemos afirmar que de iguais a ele o Congresso deve estar cheio, assumidas ou enrustidas, mais essas do que aquelas, e que, em pleno século 21 é, no mínimo uma estupidez questionar a capacidade de alguém por sua opção sexual e todo aquele blá blá blá que há anos a gente ouve por aí e que já deveria ter entrado na cabeça de todo mundo.
Para quem diz que o Clodovil deputado é um absurdo pela sua (dele) falta de projetos e planos para o país, eu pergunto: e o seu deputado? Qual é o projeto dele? Quais são os planos dele para o Brasil? O que, de prático, já fez ou afirma que vai fazer? Sem generalismos, por favor. Então, como todo mundo já sabe a resposta, ou melhor, a falta dela (com uma ou outra honrosa exceção em cada Estado brasileiro), isso não desqualifica o congressista costureiro.
Se você é do time que diz que o tal é um língua-solta, vamos lá: sinceramente, prefiro um deputado língua-solta do que um rabo preso. E, se fôssemos tirar de Brasília os que não têm o rabo preso com alguma coisa, quantos iam ficar?
Para quem acha que Clodovil é uma excentricidade, pergunta-se: Ney Suassuna não é uma excentricidade tão grande quanto? E tantos outros, como Agnaldo Timóteo, Juruna, Maluf, Jair Bolsonaro? O Brasil já deveria estar acostumado com essas excentricidades. Em todas as eleições o povo coloca, lá, alguém com um perfil, digamos, excêntrico. Aliás, o mundo inteiro tem esse comportamento. Vide Cicciolina na Itália, Reagan e Schwarzenegger nos Estados Unidos, Hugo Chavez e tantos, planeta afora. É uma praxe eleitoral, pode-se afirmar.
E, cá pra nós de novo: é possível esperar dele um pouco mais do que desses outros aí. No mínimo, cria-se a expectativa de que a língua solta de Clodovil não seja presa pelo preconceito. Espera-se dele, e acredito piamente que foi isso que o elegeu, que sua língua solta e mordaz seja ativada nas CPIs, nos apartes debochados a discursos tidos como sérios mas dúbios e duvidosos, nas excêntricas votações secretas da Câmara em assuntos de interesse do povo.
Clodovil Hernandez pode até ser uma piada. Mas, se se mantiver Clodovil Hernandez, pode ser que seja a piada daquelas que servem para desmontar a falsa sisudez, a rasa profundidade ideológica camuflada em citações retiradas de biografias. Espero, sinceramente, que em uma CPI qualquer dessas daí, Clodovil peça para um desses que estão sempre envolvidos em tudo que não presta: “olhe ali para a lente da verdade e diga olhando nos olhos do Brasil: o senhor é ou não é um surrupiador de verbas”?
Se fizer isso, só isso, já terá valido a pena pagar o mico de tê-lo como representante na Casa do Povo.

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