(publicada no Jornal O Dia, de Teresina, no dia 10 de abril de 2005)
Tenho quase que convicção de que João Paulo II foi a pessoa mais fotografada do milênio. Mais do que Lady Di, mais do que Ronaldo Grávido Fenômeno, mais do que Marilyn Monroe. Se algum dia fizerem uma pesquisa séria sobre isso, aposto que dá João Paulo II em primeiro lugar. Afinal, foram 26 anos liderando uma das maiores instituições do mundo e seus mais de um bilhão de fiéis.
Alguns criticaram um suposto excesso na cobertura da imprensa mundial na morte de Wojtyla. Outros criticaram o Vaticano pela demora nos funerais, ou por certo exagero na exibição do sofrimento e do corpo sem vida do Papa Peregrino. Não podia ter sido diferente, lá vou eu discordando de tanta gente outra vez.
João Paulo II não era, simplesmente, um Papa. Era o Papa da Mídia. Wojtyla foi alçado à condição de sucessor de Pedro, o Pescador, no fim dos anos 70, quando o mundo conheceu a Revolução da Comunicação, a explosão da mídia e da Internet. Para muitos, talvez a grande maioria da população mundial, João Paulo II era "O" Papa. Poucos tinham visto um antes dele.
Sua biografia parece ter sido criada por um roteirista, de tão perfeita para um mito. Foi pobre, ficou órfão aos nove anos, sofreu na II Guerra, era esportista e foi até goleiro (o que mostra que, desde jovem, acreditava no sofrimento como expiação dos pecados). Tudo em Wojtyla o faria o mais midiático dos papas. Sua eleição em meio ao trauma da morte de dois antecessores em um mês. O fato de ser polonês, em plena Guerra Fria. O atentado em meio à multidão e gravado em vídeo. O perdão ao atirador. O beijo no solo de cada país, nunca antes visto. As multidões que o acompanhavam em cada viagem. O posicionamento contra o comunismo. Sua capacidade de falar na língua de cada povo. Sua postura obviamente conservadora, contra o aborto e a camisinha em plena era da AIDS e da afirmação dos direitos dos homossexuais, que ajudou a acender muitas polêmicas. O pedido de perdão pela Inquisição. Sua doença pública. Sua agonia. Tudo, tudo fazia de Karol Wojtyla, que já tinha sido ator, o pop star da fé, o John Wayne da Igreja. Engana-se quem reclama da cobertura dada aos seus funerais. Nada mais natural que o último ato deste espetáculo de competência midiática termine em uma grande apoteose, junto ao seu público fiel e devotado. Até porque, na verdade, praticamente todos os ritos foram seguidos como sempre foram. A diferença é que nunca foram transmitidos ao vivo nem pela Internet, como agora. E o avassalador número de fiéis que foram ao Vaticano é fruto da competência e do carisma de Wojtyla.
É difícil perceber quando se está dentro de um fato histórico, que tem, quase sempre, a aparência de uma banalidade ou uma chateação para quem o vive. Quem assim pensa deveria mesmo era aproveitar este momento para descobrir quem era, o que pensava, o que representava alguém capaz de gerar tanta controvérsia e tanta admiração. Admire-se suas idéias e posições ou não, João Paulo II é um dos maiores símbolos do que a compreensão do que é gente, do que é comunicação e do que o saber como usar a comunicação para chegar às pessoas pode fazer.
Agora, os cardeais reunidos no Conclave têm uma missão muito, muito mais árdua do que escolher outro papa. Eles têm de escolher um novo mito. Não vai ser fácil.
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